Já é velha a notícia de que o candidato a prefeito de São Paulo José Serra lançou como proposta de política de segurança pública o acompanhamento de alunos, nas escolas, pela Fundação Casa (FEBEM), com vistas a detectar futuros criminosos e usuários de drogas.
Cesare Lombroso ficaria orgulhoso ao perceber que seu L'uomo delinquente, de 1876, em que pesem completamente desmentidas suas teses pelas ciências empíricas, ainda seduz formuladores de políticas (?) públicas de segurança.
O candidato Serrare Lombroso, ao secundar estapafúrdia ideia, revela a ponta de um iceberg: o despreparo generalizado na formulação de uma política criminal, em todos os níveis.
Quando muito, a União e os Estados têm uma política penitenciária: a construção de mais vagas para dar conta da sempre crescente quantidade de condenados à pena privativa de liberdade. A política, porém, tende a ser paupérrima e a centrar-se na construção de prédios que, posteriormente, não são mantidos ou reformados.
Ainda mais grave: as unidades não são pensadas à
luz das atividades de “ressocialização”, havendo precaríssimas condições para
ensino e atividades profissionalizantes. Isso para não mencionar o descalabro
na assistência à saúde, na alimentação e as condições de higiene.
E
política criminal, quando há, é precipuamente política penal. Exemplo gritante
disso é o Projeto de Código Penal Sarney-Dipp que aumenta o requisito de
progressão de regime para crimes violentos e hediondos, impactando os
dois grupos mais importantes de presos: os por roubo e por tráfico de drogas.
Perguntar não ofende: o que fazer com o boom prisional que se vivenciará? Hoje
o déficit de vagas já é de 230.000...
Pouco
ou nada se discute, com seriedade, no âmbito da prevenção dos delitos. O motivo
principal é que isso não dá voto, dizem. Em segundo lugar pelo conservadorismo
reinante nesse assunto, em que direita e esquerda quase não se distinguem (o
episódio Serrare Lombroso, claro, é ponto fora da curva).
Muito
embora os paradigmas etiológicos tenham sido abandonados por quase todos, disso
não decorre que não se possam prevenir condutas indesejadas. Não instalando
pre-cogs nas escolas (públicas, ficou implícito...), porém compreendendo sua
gênese, seus vetores e fatores, dentro da dinâmica social.
Zonas
da cidade cujos espaços de socialização se limitam a botecos de esquina +
ausência de espaços de mediação de conflitos + acesso fácil a armas de fogo =
homicídios violentos entre pessoas que se conhecem. Esse tem sido um
diagnóstico importante dos homicídios nas zonas de periferia de grandes
cidades. O que mudará com a maior permanência do homicida no sistema
penitenciário? Nada. Uma política criminal verdadeira buscaria fomentar espaços
coletivos de socialização, programas de composição de conflitos e de controle
(ou banimento) de armas de fogo.
O
descaso com o assunto alimenta o problema em círculo vicioso: novas vozes não
surgem, dando espaço para que alguns desavisados, acostumados com “soluções”
estapafúrdias, ao ouvir a proposta de Serrare Lombroso, pense consigo “até que
não é má ideia...”.